Um grupo de 13 ministérios e órgãos do governo federal está com a faca no pescoço e deve entrar entre agosto e setembro num quadro de “apagão†pela penúria de recursos. Outros nove ministérios estão em situação apertada e começarão a ter que “desligar†serviços e programas por falta de dinheiro entre outubro e novembro, mostra levantamento feito pelo Estado com base no que foi autorizado em gastos do orçamento de cada órgão.
Os ministérios e órgãos em situação mais crÃtica são os de Infraestrutura, Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Advocacia-Geral da União, Minas e Energia, Defesa, Ciência, Tecnologia, Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Cade, Controladoria-Geral da União, Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e Desenvolvimento Regional.
Há risco de desligamento também de serviços da Receita e atrasos maiores no Minha Casa, Minha Vida. Na faixa 1 (para famÃlias com renda de até R$ 1,8 mil) do programa habitacional, o atraso dos pagamentos subiu para 70 dias. O nÃvel de comprometimento de despesas na Antaq já chega a 99,9%. Ou seja, o agência terá dificuldade para contratar novos gastos.
Segundo apurou o Estadão/Broadcast, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e sua equipe, em reunião na quarta-feira, apresentaram ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e a um grupo de deputados um plano para conseguir R$ 20 bilhões em receitas para desafogar o Orçamento e conseguir dar um socorro aos ministérios.
Maia já tinha alertado para a gravidade da situação: ou o governo aumenta a receita em 40 dias ou terá que propor a mudança da meta fiscal, que hoje permite déficit de até R$ 139 bilhões, para conseguir desfazer uma parte do contingenciamento e evitar uma situação de caos, com paralisação de serviços, situação conhecida com “shutdownâ€.
A reportagem apurou que Guedes é contra a mudança de meta e está buscando ampliar as receitas rapidamente, o que inclui a antecipação de pagamentos de R$ 13 bilhões em dividendos pelo BNDES e pela Caixa. Outras medidas estão sendo pensadas para evitar o apagão, como o uso de reservas e “arrecadação extraâ€.
O problema para o governo é o tamanho do bloqueio, que já chega a R$ 34 bilhões. Ele pode aumentar em setembro porque o desempenho Produto Interno Bruto (PIB) não tem reagido, o que tem obrigado o governo fazer seguidas redução da previsão de receitas.
‘Escancarar’
A estratégia traçada pelo ministro Paulo Guedes é “escancarar†a situação. Portaria do Ministério da Economia, publicada na quinta-feira, 22, prevê desde a limitação do expediente dos funcionários até a suspensão do tradicional cafezinho servido na pasta para priorizar sistemas de atendimento ao cidadão, como os da Receita Federal e do INSS. O órgão que paga as aposentadorias e pensões deve ficar sem dinheiro para quitar a conta de luz já a partir de setembro.
O secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, e o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, têm sido os principais porta-vozes do quadro dramático que vive a Esplanada. Planos de contingência estão sendo feitos pelos ministérios. O presidente Jair Bolsonaro já foi avisado da situação e tem, em seguidas entrevistas, apontado para a falta de dinheiro.
O levantamento do Estado mostra que, se nada for feito até setembro, quando haverá a necessidade legal da terceira revisão do Orçamento, um novo bloqueio poderá ser necessário.
Segundo um integrante da equipe econômica, o dilema é que o governo espera mais dinheiro no final do ano com o megaleilão de petróleo, marcado para novembro, mas precisa sobreviver até lá. O dinheiro que está preso por conta do fenômeno do “empoçamentoâ€, quando os ministérios não conseguem executar um conjunto de gastos carimbados apesar da verba disponÃvel, não pode ser usado para aliviar o contingenciamento.
Com parte de seus recursos contingenciada, o Exército poderá ser obrigado a dispensar pelo menos 25 mil dos 80 mil recrutas no inÃcio de outubro, antecipando a primeira baixa, que estava prevista para dezembro.
Outro lado
A maioria dos ministérios e órgãos que estão na situação mais crÃtica confirmaram que já comprometeram a maior parte do Orçamento disponÃvel para este ano.
O Ministério do Desenvolvimento Regional, que opera o Minha Casa Minha Vida, informou que tem trabalhado junto com a Casa Civil, a Presidência e o Ministério da Economia para ampliar os limites de gastos. Segundo a pasta, o bloqueio “não afeta consideravelmente o custeio da administraçãoâ€, mas reconheceu que já encerrou contatos de terceirização para reduzir despesas internas. Os recursos disponÃveis, disse o MDR, têm sido distribuÃdos conforme estudos de demanda, priorização de programas e andamento de projetos e obras.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) confirmou que, da autorização de R$ 137,47 milhões, já comprometeu R$ 114,5 milhões, o equivalente a 83% do orçamento. No entanto, o órgão afirma que as despesas já pagas estão em R$ 67,5 milhões e ainda há disponibilidade de quase metade do valor, o que diminui a necessidade de empenhar novos gastos até o fim de 2019. Nos últimos anos, a Anac afirma que reduziu gastos com aluguéis, apoio administrativo, condomÃnio, transporte e limpeza, poupando R$ 51,7 milhões.
O Ministério da Infraestrutura afirmou que já enxugou postos de trabalho e fundiu secretarias, obtendo economia de R$ 14,5 milhões. “Além dessa reestruturação, a revisão de contratos e o corte de gastos com diárias e passagens devem elevar essa economia a R$ 26,2 milhõesâ€, disse.
O Ministério da Defesa e as Forças Armadas informaram que ainda trabalham com a possibilidade de liberação dos recursos bloqueados. “No entanto, estudam alternativas caso se prolongue o referido bloqueioâ€, disse a nota, sem informar detalhes.
A AGU informou que tem adotado diversas medidas para cortar despesas, como substituição da vigilância fÃsica por eletrônica, diminuição de serviços de copa e de alugueis de veÃculos, além de renegociar aluguéis de imóveis. A economia chegará a pelo menos R$ 32,2 milhões até o fim do ano, segundo o órgão.
O Cade confirmou que já comprometeu R$ 26,9 milhões dos R$ 30,9 milhões que estão disponÃveis após o contingenciamento – o equivalente a 87% do orçamento liberado. A lei orçamentária autorizou R$ 42,29 milhões, dos quais R$ 11,4 milhões foram bloqueados. “Ressaltamos que o Cade é um dos órgãos com menor orçamento da estrutura da administração e que a autarquia é parcimoniosa na utilização dos recursos públicos à disposiçãoâ€, diz a nota.
A Aneel informou que o orçamento destinado à agência em 2019 “é suficiente para custear as atividades de fiscalização, ouvidoria, os convênios com as agências estaduais, bem como as demais atividades da Aneel até o fim do anoâ€. “Estamos concentrando esforços para reduzir despesas, de modo a não usar o limite disponÃvelâ€, informou em nota. No ano passado, a agência diz ter economizado R$ 18 milhões.
Em nota, a Controladoria-Geral da União (CGU) afirmou que tem a preocupação constante de economizar e usar de forma “otimizada” os recursos públicos. “Em momentos de contingenciamento, o órgão aprimora ainda mais essa conduta, com a revisão dos custos e das contratações”, diz a nota. O órgão citou exemplos de cortes adotados, como contrato de copeiragem e fornecimento de café.
Procurados no fim da tarde de de quinta-feira, 22, os demais órgãos em situação mais crÃtica não responderam até o fechamento deste texto.