Apenas 20 pescadores de Mato Grosso aderiram ao auxílio de um salário mínimo do Governo do Estado após a Lei do Transporte Zero começar a valer. A Lei nº 12.197/2023 proíbe o transporte, armazenamento e comercialização de peixes dos rios de Mato Grosso por cinco anos. O número foi confirmado pelo INSS a Associação de Segmento de Pesca de Mato Grosso (ASP/MT). Segundo a presidente da ASP, Nilma Silva, os profissionais temem perder a aposentadoria e outros direitos, por isso não aderiram ao benefício.
“Segundo INSS [Instituto Nacional do Seguro Social], o profissional deixa de ser assegurado especial caso aceite o auxílio do governo. Então a maioria não aderiu. Os pescadores nunca foram consultados se queriam ou não deixar de ser pescadores, se queriam deixar de sustentar suas famílias decentemente. Além de que, a profissão que eles exercem não é ilegal, é lícita, e o Estado em momento algum sentou com eles para decidir a vida de centenas de famílias. Não tem como aderir algo que é injusto, que vem marginalizar um segmento, algo que destrói uma cultura de um povo, a identidade de um povo”, afirma Nilma.
Atualmente, o Estado tem cerca de 15 mil profissionais. Durante três anos, dos cinco que a lei ficará em vigor, eles terão direito ao auxílio de um salário mínimo por mês para pescadores profissionais e artesanais inscritos no Registro Estadual de Pescadores Profissionais (Repesca) e no Registro Geral de Pesca (RGP) que comprovem residência fixa em Mato Grosso e que a pesca artesanal era sua profissão exclusiva e principal meio de subsistência até a lei entrar em vigor. O auxílio não será pago nos meses de piracema, considerando que os beneficiários já são atendidos pela Lei Federal n. 10.779/2003. A regulamentação federal do INSS não autoriza, no entanto, o recebimento de outro tipo de indenização, o que inviabiliza a adesão dos trabalhadores.
“O INSS colocou duas notas técnicas a pedido da Advocacia Geral da União, sendo muito claro que isso iria inviabilizar a licença maternidade para mães pescadoras, o auxilio doença, ou a o direito dos pescadores de se aposentar após anos de trabalho”, pontua.
Além disso, Nilma aponta que a Lei 11.959 de 2009 estabelece que pescador tem que permanecer de forma contínua nos rios e dali tirar o seu sustento para continuar sendo assegurado especial. “Os pescadores em massa não aceitaram ser extinto por ganância e poder. Pescadores vêm morrendo infartados, causados por depressão, por desespero, por não ter direito de dar continuidade a sua profissão”, lamenta.
Após discussões, a legislação em vigor desde janeiro deste ano foi flexibilizada, reduzindo o número de proibições para 12 espécies de peixes. No entanto, Nilma afirma que isso não foi suficiente pois continua proibida a pesca dos principais peixes comercializados,.
“A flexibilização da pesca é uma vergonha, nós temos estudos técnicos da Embrapa junto com a Agência Nacional de Águas e o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), que constatam que os recursos pesqueiros estão estáveis, não há declínio. A lei penaliza mais uma vez o pobre, o pequeno, o trabalhador”, conclui.
Lei do Transporte Zero
A Lei nº 12.197/2023 foi aprovada na Assembleia Legislativa no dia 28 de junho de 2023 e sancionada pelo governador Mauro Mendes (União) no dia 21 de julho. Desde o início da discussão do Transporte Zero, o tema causou polêmicas e manifestações de parlamentares, pescadores, ribeirinhos e representantes do setor.
O Governo do Estado defende a lei sob a justificativa de que há escassez de peixes nos rios de Mato Grosso e que, por meio desta lei, há a possibilidade de repovoamento, além de pontuar que o turismo pesqueiro através do “pesque e solte”, gerará mais renda e promoverá o Estado.
Proibições
As proibições previstas na lei não alcançam a pesca de subsistência para povos indígenas, originários e quilombolas, bem como a captura de peixes às margens dos rios destinada ao consumo no local, subsistência ou à compra e venda de iscas vivas que se enquadrem na legislação.
Também estão liberadas a modalidade pesque e solte, da pesca esportiva, que tem como regra a devolução do peixe ao rio, com exceção dos meses de vigência da piracema, em que todo tipo de pesca é proibido, e a modalidade pesque e pague, desde que o estabelecimento faça a emissão da nota fiscal dos peixes que serão transportados e armazenados pelo pescador.
Kethlyn Moraes/RD News