O Brasil ultrapassou os Estados Unidos no percentual de vacinados contra a Covid-19. É o que mostra o portal Our World in Data, vinculado à Universidade de Oxford, na Inglaterra.
A informação foi compartilhada numa rede social pelo cientista Eric Topol, cardiologista, fundador e diretor do Scripps Research Translational Institute, e professor de Medicina Molecular no Scripps Research Institute.
Segundo Topol, o Brasil se uniu a outros 55 países que superaram os índices americanos. Ele tem relatado dados sobre a Covid-19 em sua conta no Twitter.
Conforme a plataforma Our World in Data, no dia 14 de novembro, 59,8% dos brasileiros já estavam com o esquema vacinal completo contra a Covid-19. Enquanto nos EUA, na mesma data, o índice chegou a 57,6%.
De acordo com as informações do consórcio de veículos de imprensa, no dia 14 de novembro, o Brasil atingiu 125,4 milhões de pessoas vacinadas com duas doses, de um total de 213,3 milhões –número que o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) projeta para a população brasileira atual.
Assim, estão completamente imunizados contra a Covid 58,8% da população do país. Os percentuais do consórcio de imprensa e do Our World in Data diferem ligeiramente por usarem bases de dados diferentes, com atualizações distintas.
O percentual de imunização do Brasil é semelhante ao computado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (compare no gráfico abaixo). O órgão registra a vacinação completa de cerca de 195,3 milhões de americanos.
Na plataforma inglesa é possível comparar dados de vários países. Na ferramenta, é possível notar, por exemplo, que o Chile ultrapassou os EUA no início de junho na proporção de pessoas que completaram o esquema vacinal contra a Covid.
No dia 4 daquele mês, o país da América do Sul marcou 43,9% da população vacinada com as duas doses, 0,2% a frente. No dia 12 de novembro, último dado divulgado pelo Chile, estava com 81,8%.
A Austrália, em 18 de outubro, passou os EUA em um ponto percentual e chegou a 69,3% em 14 de novembro. A União Europeia, em 2 de agosto, havia alcançado 49,9% de vacinados contra 49,8% dos americanos e subiu até 66,2% em 13 de novembro, último dado informado até a conclusão da reportagem.
O governo dos EUA autorizou o início da vacinação contra o coronavírus para 14 de dezembro do ano passado, com o imunizante produzido pela americana Pfizer em parceria com a alemã BioNTech.
No dia 17 de janeiro, em São Paulo, a enfermeira do Instituto de Infectologia Emílio Ribas Mônica Calazans, 54, foi a primeira brasileira a receber a vacina. Ela foi imunizada com a Coronavac, produto da chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan. Para Raquel Stucchi, infectologista da Unicamp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia, o fato de o Brasil ter alcançado quase 60% de população completamente vacinada é uma boa notícia, mas não deve ser visto como uma vitória.
“É muito mais mérito dos Estados Unidos do que do Brasil. O Brasil deveria ter ultrapassado os Estados Unidos em meados de maio, porque nós temos uma população que aceita muito a vacinação, graças ao Programa Nacional de Imunização em suas campanhas”, pondera.
“Só não avançamos mais devido a alguns fatores como a dificuldade em termos vacinas e não termos começado mais precocemente a vacinação. A nossa projeção, enquanto infectologistas e sanitaristas, é que o Brasil poderia ter alcançado os 80% de população vacinada já no primeiro semestre.”
Marcia Castro, cientista, professora de demografia da Faculdade de Saúde Pública de Harvard, membro do Observatório Covid-19 BR e colunista da Folha, não se surpreende com a notícia.
Ela também ressalta que o Brasil tem tradição em campanhas de imunização e isso não é uma regra nos EUA.
“Há estados com a cobertura muito baixa –os Estados Unidos vivem a pandemia dos não vacinados– e tem cidades que oferecem dinheiro tentando fazer com que as pessoas tomem a vacina. Você chega no limite e não consegue mais ter pessoas se vacinando. Era inevitável que o Brasil ultrapassasse os EUA, porque a força do movimento antivacina é muito mais forte”, comenta.
Para ela, o Brasil precisa agora expandir a cobertura, garantindo a segunda dose a quem ainda não recebeu, assim como o reforço aos idosos que tomaram a Coronavac no começo da campanha.
“Essa euforia de achar que tudo acabou e tirar o requerimento das máscaras… É preciso ter cuidado, porque ainda tem muita gente não vacinada e o vírus ainda está circulando”, diz Castro.
Além disso, o Brasil necessita aumentar a estratégia de testagem, afirma a professora.
“Seria necessário muito mais teste de antígeno, que tem um resultado rápido para a população. As pessoas deveriam ter acesso a esses testes rapidamente, direto via SUS ou com custo baixo. Sem uma estratégia de contenção, como diminuir a circulação?”
O médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto, professor de saúde pública da USP, vê o desempenho brasileiro como uma consequência de haver aqui um sistema de saúde pública universal, o SUS.
“Os americanos foram mais ágeis em comprar vacina e menos em utilizá-las. Nós compramos menos vacinas, tivemos distribuição menor, mas conseguimos aplicar mais”, resume.
Evaldo Stanislau de Araújo, infectologista do Hospital das Clínicas da USP, lembra que, para além da marca positiva brasileira ao conseguir superar os EUA, é preciso atenção com a duração da resposta de imunidade.
Os Estados Unidos já têm hoje pelo menos três estados que liberaram a dose de reforço para qualquer pessoa vacinada. No Brasil, o reforço ainda não foi adotado nesses moldes.
“Essa questão da resposta imune é importante para essas vacinas que estamos utilizando agora. Se o Brasil não fizer um planejamento adequado para 2022 e os outros anos que virão, com certeza voltaremos a ter problemas, inclusive porque a circulação aumentou muito”, afirma Araújo.
“Hoje, o Brasil está numa situação confortável, mas precisa se planejar para manter um nível de imunidade bom”, conclui.
Como reflexo da imunização, quatro em cada cinco cidades com mais de 100 mil habitantes no Brasil tiveram redução de novos casos da Covid-19 em outubro, maior índice de toda a pandemia.
Os dados são do monitor de aceleração da Covid da Folha, que mede a velocidade de crescimento de novas infecções pelo coronavírus nos estados e municípios grandes, que têm dados mais estáveis e confiáveis que os menores.
Em média, outubro teve, por dia, 260 cidades no estágio de desaceleração, quando o número de novos casos está em queda. Isso representa 80% das 326 cidades com mais de 100 mil habitantes.
Folha