A superlotação nos presÃdios brasileiros e a epidemia de violência doméstica foram as principais questões levantadas no relatório mundial da ONG Human Rights Watch, especializada em direitos humanos, sobre o Brasil.
O relatório anual, divulgado nesta quinta-feira (17), mostra a ONG preocupada com ações tomadas pelo atual governo. “O presidente Jair Bolsonaro (PSL) deve tratar a crise da segurança pública por meio de medidas que reduzam o crime e, ao mesmo tempo, respeitem os direitos humanosâ€, disse o diretor para as Américas, José Miguel Vivanco.
O diretor exemplifica que em seu primeiro dia de mandato, o capitão reformado editou uma medida provisória estabelecendo que cabe à Secretaria de Governo “supervisionar, coordenar, monitorar e acompanhar as ações e atividades†de ONGs. “Isso não pode ocorrer, independentemente se aquela organização recebe dinheiro público ou não, porque mina o papel que ela tem em uma sociedade aberta e democráticaâ€, justificou.
Violência doméstica
A ONG traz em seu novo relatório o enfraquecimento da rede de proteção a mulher. Dados da própria Secretaria Nacional de PolÃticas para Mulheres apontam que houve redução do número de casas de acolhimento: de 97, em 2016, para 74, em 2017. Também registrou encolhimento de centros especializados de atendimentos à s mulheres, de 256 para 241, além de 504 delegacias da mulher, em 2016, para 497, em 2017.
Os gastos da Secretaria Nacional também diminuÃram. Em 2014, a pasta possuÃa R$ 73 milhões. Em 2018, no entanto, o número caiu para R$ 43,3 milhões. “Quando se tem menos lugares para que as mulheres possam recorrer, cada vez mais as tentativas de feminicÃdio e o feminicÃdio em si podem aumentar, porque não vai ter um órgão que controle, ampare e aja judicialmenteâ€, diz Vivanco.
O pesquisador da ONG César Muñoz aponta que muitas das vezes as mulheres não denunciam pelo simples fato de que a polÃcia não segue com aquela investigação. “Uma vez uma mulher me contou que não ia denunciar porque uma amiga dela fez a mesma coisa e ela continuou apanhando do marido. É preciso eficácia do serviço de atendimento à mulher.â€
Entre as medidas que a organização apresentou, estão a abertura de delegacias da mulher nos horários em que há mais violência doméstica (à noite e aos fins de semana), obtenção de declaração imediata da vÃtima no momento em que a denúncia é feita, disponibilização de salas privativas nas delegacias para depoimento, elaboração de protocolos de atuações de PMs e monitoramento eficaz de todas as medidas protetivas, entre outras.
Sistema carcerário
O total de pessoas encarceradas no paÃs chegou a 726.712, em junho de 2016. E esse número tende a aumentar, segundo estimativa do governo anterior, que avaliou que até o final de 2018, cerca de 840 mil pessoas estariam presas. Cerca de 40% da população carcerária são detentos provisórios.
Bolsonaro, segundo a organização, defende amontoar ainda mais pessoas no sistema, que já detém o dobro do número de presos para o qual foi projetado. “Muitas vezes, estão encarcerados em celas insalubres, violentas e controladas por facçõesâ€, comentou Vivanco.
A ONG aponta que, ao invés de considerar polÃticas que violem os direitos humanos, o governo adote reformas consistentes com as obrigações internacionais do Brasil em direitos humanos e que sejam mais eficazes na redução da criminalidade.
Vivanco relembrou uma declaração de Bolsonaro enquanto candidato, em que ele dava “carta branca†à polÃcia para matar suspeitos — o mesmo ocorreu em São Paulo, com João Doria (PSDB), e no Rio de Janeiro, com Wilson Witzel (PSL).
Para ilustrar a preocupação da ONG, Vivanco apontou dados do Instituto de Segurança Pública: a polÃcia brasileira matou, em 2017, 5.144 pessoas. Somente no Rio, 1.444 morreram entre janeiro e novembro, do ano passado — é o maior número de homicÃdios cometidos por PMs desde que o Estado começou a coletar esses dados, em 1998. “Você tem casos em que a polÃcia matou e são justificáveis. Mas tem outra parcela, bastante considerável, de execução mesmoâ€, conta. “E esses policiais continuam impunes, muitas das vezes.â€
A organização apontou, então, seis medidas para reformar o sistema prisional brasileiro. São elas: retomar o controle das prisões, separar os presos, prover programas educacionais e de trabalho dentro dos presÃdios, ampliar o acesso à Justiça, reduzir o número de presos que aguardam julgamento e reformar a polÃtica de segurança.