Pressionado a relançar o auxílio emergencial para dar assistência a famílias vulneráveis, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse nesta segunda-feira, 26, que o governo pode retomar os programas de socorro, caso haja o entendimento de que o número de mortes por covid-19 continuará acima de mil por dia e a vacinação pode atrasar.
Nessa situação, o ministro disse que será declarado novamente “estado de guerra”. Mas ele alertou que essas medidas precisarão vir acompanhadas de ações para conter gastos e ajudar a “pagar a conta” dessa batalha, como o congelamento de salário dos servidores por dois anos e o não aumento automático de verbas para educação, saúde e segurança.
“Se a pandemia se agrava e continua 1,5 mil mortes por dia, a vacina não chega e falhamos miseravelmente, mas não acredito nisso… Mas caso o pior aconteça, temos protocolo da crise, aperfeiçoado agora”, afirmou Guedes em evento online do banco Credit Suisse. “Se disser que pandemia está realmente assolando o Brasil de novo, você vai declarar estado de guerra, como a gente declarou no ano passado.”
O ministro citou diferentes referências, em termos de número de mortes diárias por covid-19, para deflagrar o estado de guerra. Os números ditos pelo ministro ficaram entre 1 mil e 1,6 mil óbitos por dia. “Se a pandemia faz a segunda onda, com mais de 1,5 mil, 1,6 mil, 1,3 mil mortes, saberemos agir com o mesmo tom decisivo, mas temos que observar se é o caso ou não”, disse Guedes em outro momento.
No Brasil, o recorde de número de mortes por covid-19 foi registrado em 4 de agosto de 2020, com 1.394 óbitos. O segundo maior número foi em 8 de janeiro deste ano, com 1.379 mortes. Na segunda-feira, 25, de acordo com dados do consórcio de veículos de imprensa, a média móvel de mortes – que registra as oscilações dos últimos sete dias e elimina distorções entre um número alto de meio de semana e baixo de fim de semana – ficou em 1.055. Há cinco dias, o patamar está acima de mil mortes.
Segundo Guedes, o estado de guerra inclui medidas de ajuda, mas contempla também uma série de iniciativas para conter despesas. “Estado de guerra é não ter reajuste pro funcionalismo por dois anos, (ter) pisos bloqueados, acabou essa coisa de subir automaticamente”.
“Quer criar o auxílio emergencial de novo? Tem que ter muito cuidado. Pensa bastante, porque se fizer isso, não pode ter aumento automático de verbas para a educação, para segurança pública, porque a prioridade passou a ser absoluta, é uma guerra, e durante a guerra, é fazer armamento bélico. Pega os episódios de guerra aí e vê se teve aumento de salário durante a guerra, se teve dinheiro para saúde, educação. Não tem. É dinheiro pra guerra. Aqui é a mesma coisa. Se apertar o botão ali, vai ter que travar o resto todo. Então vamos observar a economia, vamos observar a saúde, os dois andam juntos, e vamos esperar o melhor”, afirmou.
Na PEC do pacto federativo, o governo já chegou a propor a desvinculação de pisos de gastos em saúde e educação. “Tem que fazer o 3D (desindexação, desvinculação, desobrigação)”, acrescentou.
O ministro ponderou que, apesar da possibilidade de retomar as ajudas, é preciso haver contrapartida para equilibrar as contas, uma vez que o País já elevou drasticamente sua dívida no ano passado para bancar as despesas de combate à pandemia. Na projeção do ministro, a dívida terminou 2020 em 90% do PIB.
“A classe política tem que assumir responsabilidade pelo orçamento. Se classe política apertar botão vermelho da emergência, não é pegar dinheiro e sair correndo. Tem que pagar o custo da guerra (adotando medidas)”, afirmou. Guedes comparou o excesso de gastos, sem contrapartidas de ajuste, a uma bomba atômica. “Vai ter tragédia para todo lado”.
Apesar de admitir a possibilidade de um novo estado de guerra, Guedes disse “esperar o melhor”, com vacinação em massa e queda no número de mortes. Ele chamou o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, de “especialista em logística” e citou o exemplo de Israel, que vacinou os idosos e vê agora uma queda significativa no número de óbitos por covid-19.
“Se focalizarmos nos próximos 2 meses vacinação nos idosos, a coisa desce. Se não for o caso, porque vacinação não anda ou mortes estão acima de 1 mil, já existe protocolo”, disse Guedes.
Ele citou ainda a “cláusula de calamidade pública” na PEC do pacto federativo, para um caso mais agudo do que o de uma emergência. “O presidente Bolsonaro vai deixar um legado para esse tipo de crise. Agora, é um botão nuclear. Quando está em guerra, não é só receber armamento, tem que pagar pelo armamento”, afirmou, após lembrar do auxílio emergencial concedido pelo governo em 2020.
Como mostrou o Estadão, a partir da experiência da pandemia, Guedes tem defendido a criação de uma “cláusula de calamidade” a ser incluída na PEC do pacto federativo. O Conselho Fiscal da República, a ser criado, poderia nesse caso suspender as limitações das atuais regras fiscais ao aumento de gastos, com o objetivo de combater os efeitos negativos da calamidade na economia. O conselho está previsto na PEC e seria formado pelos presidentes da República, Senado, Câmara, Supremo, entre outros.
O ministro manifestou, contudo, uma visão positiva sobre a vacinação – citando a capacidade do Brasil de produzir 300 milhões de doses de imunizantes por ano – e seu potencial de trazer a economia de volta à normalidade para o País priorizar a agenda de reformas que, conforme observou, são “fundamentais” para recuperar a dinâmica de crescimento perdida nas últimas décadas.