Representantes de diversos setores do agronegócio estão alarmados com o que consideram ser um viés anti-China espalhado no governo Bolsonaro. “Estamos comprando briga com nosso maior parceiro comercial e nem sabemos porque, só para imitar o Trump (presidente americano Donald Trump)â€, diz Pedro de Camargo Neto, vice-presidente da Sociedade Rural Brasileira e ex-secretário de comercialização e produção do Ministério da agricultura.
Representantes de diferentes setores do agronegócio ouvidos pela Folha relataram que a mensagem que têm recebido no governo é de que é preciso reduzir a “sino-dependênciaâ€, diversificar mercados e diminuir a exposição à China. Setores como o de carnes, suco de laranja, algodão e soja, que fazem grandes exportações para a China ou têm planos de expandir, manifestaram preocupação.
Em encontro recente na sede da Frente Parlamentar da Agropecuária com diversas entidades do setor, representantes do Ministério da Agricultura tranquilizaram os produtores, afirmando que não haverá rompimento com a China. Mas desestimularam produtores de aumentar exportações para o paÃs, encorajando-os a buscar mercados em algum dos 119 paÃses com representações brasileiras.
O discurso de o ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, para alunos do Instituto Rio Branco nesta segunda-feira foi a gota d’água.
O chanceler afirmou que o Brasil não vai vender sua alma para exportar minério de ferro e soja.
A China é a maior compradora de soja e minério de ferro do Brasil. “Nós queremos vender soja e minério de ferro, mas não vamos vender nossa alma. Querem reduzir nossa polÃtica externa simplesmente a uma questão comercial, isso não vai acontecer.â€
Araújo também questionou se a parceria com a China seria benéfica para o Brasil. “De fato, a China passou a ser o grande parceiro comercial do Brasil e, coincidência ou não, tem sido um perÃodo de estagnação do Brasil.â€
Produtores procuraram o lÃder da Frente Parlamentar AgrÃcola, deputado Alceu Moreira (MDB), e pediram que marcasse uma reunião com Araújo.
Também procuraram a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que teria prometido a integrantes do setor que conversaria sobre o assunto com o presidente Jair Bolsonaro na viagem aos EUA.
Araújo está tentando desfazer o mal-estar das declarações. Agendou um almoço com a ministra Tereza Cristina e parlamentares da bancada agrÃcola na quinta-feira. Na quarta, recebeu o presidente da Confederação nacional da Agricultura e ouviu que a China é um parceiro fundamental para os produtos brasileiros.
Em entrevista na quinta-feira, após reunião preparatória para a cúpula dos Brics, Araújo também contemporizou, ao ser questionado sobre as declarações.
“Não me referia à China, falei de qualquer parceiro – nossa polÃtica comercial tem que vir junto com polÃtica de reforço dos nossos valores. Precisamos trabalhar tanto com crescimento econômico, quanto com os valores mais profundos da nacionalidade.â€
Segundo representantes do setor, a eleição de Bolsonaro havia sido comemorada como o fim da ideologização da polÃtica externa e comercial. Mas, agora, os produtores estariam muito preocupados porque veem profunda ideologização– no lado oposto.
O setor que já estava muito preocupado com as repercussões da intenção de transferir a embaixada brasileira em Israel para Jerusalém. Diversos paÃses árabes sinalizaram seu descontentamento e embaixadores pediram audiências com vários ministros. O Oriente Médio é um dos maiores compradores de proteÃna animal do Brasil.
Agora, temem que a próxima ação do governo seja de distanciamento do Irã, outro grande comprador de proteÃna animal brasileira. O deputado Eduardo Bolsonaro já criticou o Irão e afirmou que o propósito da polÃtica externa brasileira seria se aproximar dos paÃses sunitas. O Irã é xiita.