Entre os principais indicadores do grau de democracia numa sociedade está a liberdade de imprensa. A imprensa livre está consagrada na nossa Constituição democrática e na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Ataques a jornalistas e agressões a veículos de comunicação são, portanto, manifestações que colidem com o mandamento constitucional e indicam pouco apreço pelo pluralismo democrático.
Todo aprendiz de tiranete tenta calar vozes críticas e independentes. Toda seita de extremistas busca desacreditar opiniões dissonantes.
Os métodos empregados são os mais variados: desde a asfixia econômica, pressionando anunciantes e assinantes dos veículos de comunicação não alinhados com o oficialismo; até a intimidação física, com ameaças, agressões e mesmo atentados e assassinatos dos profissionais de imprensa.
Além disso, o financiamento com verbas públicas de emissoras, jornais e portais “chapas-brancas” para divulgarem a versão oficial; e outros, da “imprensa marrom”, com a finalidade de difamarem os opositores.
Na recente ditadura militar que oprimiu o Brasil por duas décadas, houve de tudo. Jornalistas foram perseguidos, cassados, caçados, exilados e banidos. As redações eram censuradas. Determinados assuntos eram proibidos. Transparência zero e arbitrariedade total. Um jornalista paulista, Vladimir Herzog, foi covardemente assassinado quando estava sob a custódia do Exército brasileiro. Esse crime não foi o único, mas foi determinante para desmascarar a crueldade pútrida daquele regime.
Como se sabe, ainda hoje é necessário denunciar a incompetência e a corrupção daquela ditadura, uma vez que se encontram por aí energúmenos, saudosistas dos tempos sombrios e que não se envergonham de apregoar mentiras e pregar intervenção nos Poderes Judiciário e Legislativo, bem como a reedição de normas ditatoriais como o AI-5.
Traidor da Constituição é traidor da Pátria, como ensinou Ulysses Guimarães. Alguns desses traidores têm engambelado audiências incautas com uma grotesca mistificação da história.
É bizarro que esse fenômeno ocorra no Brasil. Não há na Alemanha nenhum grupo expressivo que queira restaurar o nazismo. Da mesma forma na África do Sul em relação ao apartheid. Nos nossos vizinhos Chile, Argentina e Uruguai, ninguém tem dúvidas quanto aos crimes praticados pelas respectivas ditaduras militares, siamesas da brasileira. Aqui, esse apego nostálgico de alguns ao que há de mais trevoso, vergonhoso e humilhante em nosso passado é algo que desafia a lógica, a antropologia e a psiquiatria.
Mas, de volta ao tema da liberdade de imprensa.
Nos últimos tempos, não há um só dia sem um episódio de agressão a jornalistas, fotógrafos e outros profissionais da imprensa. São insultados em entrevistas por autoridades que deveriam dar exemplos de equilíbrio e compostura. São hostilizados por fanáticos ao fazerem reportagens ou transmissões de eventos em locais públicos. São vilipendiados de forma sórdida pelas usinas do ódio nas redes sociais.
Às vezes a imprensa erra? Claro que sim. Em 1982 uma poderosa emissora de televisão procurou dar cobertura à tentativa de fraude eleitoral do candidato do regime militar contra Leonel Brizola, no famoso Caso Proconsult. Mas quem a desmascarou foram outros jornalistas, de extrema dignidade e coragem, que trabalhavam na hoje inexistente Rádio Jornal do Brasil.
Aquela emissora, posteriormente, buscou se redimir, renovar sua linha editorial e adotar práticas mais consentâneas com a democracia.
Como em todas as atividades, há bons e maus profissionais. Mas a liberdade de imprensa é um valor supremo, irrenunciável e inegociável numa sociedade democrática.
Minha solidariedade a todos os jornalistas e profissionais de imprensa que têm sido covardemente atacados no Brasil. Imprensa não é lixo. Lixo é o destino que a história reserva àqueles que a agridem.
Luiz Henrique Lima é conselheiro substituto do TCE.