O presidente Jair Bolsonaro disse nesta quarta-feira, 20, que errou ao ter se posicionado contra a reforma da Previdência, quando era deputado federal. Ao entregar nesta manhã a proposta ao Congresso, ele pediu apoio para aprovação do texto e afirmou que, se à época em que era parlamentar tivesse o conhecimento de hoje sobre a situação da Previdência, teria avalizado mudanças na aposentadoria.
“Nós temos que juntos realmente mostrar, não só para o mundo, mas para nós mesmos, que erramos no passado, eu errei no passado, e temos oportunidade Ãmpar de garantir para as futuras gerações uma Previdência onde todos possam receber”, disse o presidente aos parlamentares. A fala foi gravada e compartilhada pelo deputado Capitão Augusto (PR-SP).  “Contamos com os senhores para aperfeiçoar o projeto”, disse.
O presidente também admitiu que o texto enfrentará dificuldades para ser aprovado no Congreso. “ Sou igualzinho a vocês, somos iguais, temos o mesmo propósito, o mesmo ideal. A proposta que no momento chega aqui, nós sabemos das dificuldades, mas todos nós no Brasil contamos com a competência, o patriotismo e o compromisso dos senhores de salvar o Brasil economicamente. Nós não temos outra saÃda”, afirmou.
Além de se mostrar contrário à reforma quando era deputado, Bolsonaro afirmou na campanha eleitoral do ano passado que o desequilÃbrio nas contas públicas não tinha qualquer relação com a Previdência. Chegou a dizer, ainda, que jamais atuaria para levar “miséria†aos aposentados por exigência do mercado financeiro.
“Foi um gesto de humildade do presidente admitir que, no passado, errou sobre a Previdência. Ele disse que, como parlamentar, não compreendeu a importância da reformaâ€, contou Baleia Rossi (SP), lÃder do MDB na Câmara. O deputado participou da reunião em que Bolsonaro e os ministros Paulo Guedes (Economia) e Onyx Lorenzoni (Casa Civil) apresentaram a proposta aos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e a lÃderes partidários.
Na prática, a indefinição sobre o tamanho e a coesão da base de apoio do governo no Congresso preocupa o Palácio do Planalto. Nesta terça-feira, 19, por exemplo, o governo sofreu sua primeira derrota na Câmara, que derrubou o decreto sobre classificação de documentos ultrassecretos. Foi um revés sofrido pelo Executivo no rastro da crise polÃtica provocada pela demissão do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno.
“Nós vamos ter de juntar os cacosâ€, disse a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), para quem Bolsonaro precisa começar a conversar com o Congresso. “Há muitos deputados insatisfeitos, que estão mostrando o descontentamento no plenárioâ€, argumentou ela. Responsável pela articulação polÃtica do Planalto com o Congresso, o ministro Onyx afirmou, a portas fechadas, que a hora de consolidar a base de sustentação do governo é agora. “Ainda não há mesmo partidos que se declaram como base do governo, com exceção do PSL (sigla de Bolsonaro), mas isso está em construçãoâ€, concluiu Baleia Rossi.
Como deputado, Bolsonaro sempre foi contra reforma da Previdência
Em sete mandatos consecutivos como deputado federal, Jair Bolsonaro sempre fez questão de marcar posição contrária a qualquer mudança no sistema de aposentadoria. O atual presidente da República votou contra, por exemplo, todas as versões da proposta de reforma da Previdência levadas ao plenário da Câmara no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
Conhecido por defender uma agenda conservadora, o então deputado do chamado “baixo clero” sempre ficava ao lado do PT na oposição ao governo do PSDB quando o assunto se referia a alguma mexida nos benefÃcios do INSS.
Em 1998, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma da Previdência enviada ao Congresso por Fernando Henrique foi aprovada com voto contrário de Bolsonaro. Na ocasião, ele manifestou descontentamento com a fixação de limites de idade e exigências relativas ao tempo de contribuição para servidores civis.
“A princÃpio, ela (a reforma) não atinge de forma negativa os militares (…) Todavia, com o pensamento nos servidores civis — porque não posso admitir que a aposentadoria seja permitida apenas após os 60 anos de idade –, votei contrariamenteâ€, disse Bolsonaro, quando a proposta ainda tramitava, em fevereiro daquele ano. Em maio de 1998, ele também votou contra a inclusão da idade mÃnima de 60 anos (homens) e 55 (mulheres) para a aposentadoria de trabalhadores do setor privado.
Mais tarde, no segundo mandato de FHC, Bolsonaro novamente se aliou à oposição e cravou um sonoro “não” ao projeto que criava o fator previdenciário — um complexo instrumento de cálculo do benefÃcio, que persiste até hoje e acaba reduzindo o valor da aposentadoria.
Já em 2003, o deputado apontou contradições no discurso do PT quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva encaminhou ao Legislativo a proposta de reforma previdenciária. Mais uma vez, Bolsonaro votou contra. “Não sei se os colegas do PT vão conseguir dormir em paz. Vou até fazer-lhes uma recomendação: subam hoje, em casa, numa balança. Quem perder menos de três quilos, até terça-feira da próxima semana, que vote favoravelmente à PEC 40 no segundo turnoâ€, provocou ele, dirigindo-se à bancada petista.
Mesmo com protestos, greve de servidores públicos, enquadramento e expulsão de quadros históricos do PT, como a então senadora HeloÃsa Helena, a reforma enviada por Lula recebeu sinal verde do Congresso. À época, o então deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), hoje ministro-chefe da Casa Civil, também foi contra à s alterações no sistema previdenciário.
Em 2009, no segundo mandato de Lula, o plenário da Câmara aprovou a extinção do fator previdenciário criado dez anos antes, na gestão de FHC. Bolsonaro e Onyx se juntaram à maioria dos colegas e votaram para derrubar o fator. Lula, no entanto, vetou a mudança e manteve o dispositivo.
Três anos depois, em 2012, a presidente Dilma Rousseff sancionou uma lei que limitou a aposentadoria de novos servidores da União ao teto do INSS e criou um plano de previdência complementar. Bolsonaro também se posicionou contra. “A única certeza que podemos ter, neste governo, é que pior tudo poderá ficarâ€, esbravejou ele, naquele ano.
Em 2015, porém, Bolsonaro votou a favor da fórmula 85/95, que criou brechas para substituição do fator previdenciário. O novo modelo permitiu que beneficiários da Previdência se aposentassem com valor integral, sem a incidência do fator, se a soma da idade com tempo de contribuição ao INSS chegasse a 95 anos no caso de homens e de 85, no de mulheres. O aumento dessa pontuação, no entanto, aumenta ao longo dos anos, já que se trata de uma fórmula progressiva.