Em uma mansão no bairro Shangri-lá, em Cuiabá, cercada por muros de mais de 2 metros de altura, funciona, no mais completo sigilo, uma casa de swing ou troca de casais e balada liberal. Na boate, está liberado também ménage (que é o sexo a três), suruba (a 4 ou mais), sadomasoquismo (com sofrimento), voyeurismo (fetiche de só olhar cenas eróticas) e outras práticas sexuais nada ortodoxas.
A casa está se preparando para abrir também para gang, que é uma mulher transando com vários homens ou o contrário. E está reformando o setor de glory hole, em que o homem introduz o pênis em buracos e do outro lado mulheres fazem sexo oral nele, o chamado “boquete”. Neste ambiente, as partes não se veem e não sabem quem são.
O entrou na Fire Club na noite desta quinta (3) e observou cada detalhe. As fotografias e vídeos foram autorizadas pela casa e pelos clientes. Não há letreiro na porta. Logo na entrada, um portão elétrico se eleva e um segurança recebe quem chega, podendo entrar com veículo próprio em estacionamento privativo, com capacidade para mais de 60 carros. Os clientes são VIPs, segundo o dono do empreendimento erótico, que se identifica como casal J.J., já que o empreendimento é conduzido por ele e a esposa.
Rodinei Crescêncio
Piscina cheia de luzes logo na entrada da mansão: só é autorizado entrar nela nu ou com roupas íntimas e fotos estão expressamente proibidas pelo sigilo
Os clientes são, conforme diz, autoridades do Judiciário e do Ministério Público, assim como advogados, médicos e outros profissionais liberais, além de muitos servidores públicos. A boate atrai também uma classe média, que é assídua frequentadora. Todos devem ter acima de 18 anos, mas não tem limite de idade.
O casal, comprovando vínculo logo na entrada, paga R$ 50 e pode usar toda infraestrutura da mansão. Homem solteiro tem que desembolsar R$ 150 e mulher solteira é free, por ser muito procurada para ménage, como explica o empresário. O bi feminino é comum na casa. “Já pensou sua mulher beijando o marido de um lado e outra mulher em seguida? Lá fora poderia pegar mal, mas aqui dentro é natural”.
A comprovação do vínculo do casal se dá por fotos nas redes sociais ou outro documento. Casal “montado”, ou seja, só para fingir naquele momento, não é aceito. Quem mente, pode ser retirado do local.
Já na entrada da mansão dá para ver uma piscina grande, toda iluminada com luzes neons, predominando para o roxo, uma cor considerada afrodisíaca. O empresário, de 33 anos, que recebeu a reportagem na Fire Club, explica que essas luzes ofuscam fotos caso alguém insista em usar celular e câmera, equipamentos expressamente proibidos.
Ele está há 14 anos no meio. “Há um mercado forte do erotismo aí, com resorts, viagens e boates”, detalha.
Regras claras
As regras já começam na entrada da casa. Celulares e câmeras são proibidos. Para entrar na piscina, somente nu ou com roupas íntimas.
Na Fire Club, que, traduzindo, significa clube do fogo, as regras são claras. A principal dela é o respeito: ninguém “assedia” ninguém de forma desconfortável. Solteiros não abordam casais e sim somente vice-versa. E não é não.
Infringiu? Seguranças entram em ação. “Eu mesmo aviso: parceiro, você está incomodando. Tenho casal barrado, solteiro barrado. Fez graça, pode sair. Não é tanto a bebida, o que mais leva o pessoal a fazer graça é o tesão, quando sobe para a cabeça…Tem também os que bebem antes de chegar para tomar coragem e já chegam aqui para lá de Bagdá”, relata o empresário.
Segundo ele, os próprios clientes também agem, se perceberem alguém passando dos limites impostos.
Ocorre que os clientes, a maioria deles, são fiéis e já sabem como tudo funciona. Sendo assim, de acordo com o casal J.J., é muito raro haver problemas com excessos.
Ainda na área externa, há mesas com cadeiras dispostas, para quem quiser tomar um drink, ao ar livre, e uma delas é de sinuca. A mesa de sinuca, conforme explica o dono da boate, aparece em muitos filmes e isso provoca um fetiche, que é transar em cima dela. E isso pode. Só não é permitido subir nela de sapatos.
Aliás beijar, transar e fazer sexo oral é autorizado em qualquer ambiente da casa, no momento que tiver vontade, portanto não vai se sentir bem quem não estiver em condições de assistir a essas cenas mais picantes.
A casa tem uma churrasqueira de grande porte, com uma cozinha, onde, em eventuais domingos, acontecem churrascos privativos com casais liberais, que estão a fim de apimentar a relação e chamar mais gente para a cama, a banheira ou apenas para dançar na boate, só na sedução do momento.
A boate
A porta que dá entrada à boate é como se fosse a porta da sala da mansão. No local tem outra mesa de sinuca onde uma menina fazia sexo oral em um homem, quando a reportagem entrou. Ele estava bem vestido, de óculos e cabelos bem penteados, com um certo ar de nerd ou intelectual. A parceira usava short jeans, blusinha e tênis.
Uma garota bem jovem, tatuada, de piercing, faz o serviço de “barman”. A função dela ali é preparar os drinks e servi-los: caipirinha e as caipifrutas, além de cervejas e outras bebidas. A casa não pratica preços muito diferentes dos de mercado. A cerveja long neck, por exemplo, custa R$ 12. Havia cozinha expressa, mas foi suspensa nesta pandemia de Covid-19. Então, no momento, o bar só vende bebidas e drinks. Não há cobrança de 10%.
O funk toca alto e as mulheres costumam usar as barras de pole dance para dançar. Muitas exibem roupas mais sensuais, salto alto e isso não implica em alguém poder passar a mão. Essa prática de passar a mão, roubar beijo, muito comuns em bares abertos, na Fire Club é infração. Não pode.
Ao lado da pista de dança, onde há outras mesas dispostas e um sofá, em um canto mais escuro. No sofá, pode tudo. Ao lado dele, entra-se para o corredor de quartos.
Os quartos
Um deles é totalmente escuro e as pessoas só vão entrando e se deparando com outras, para sexo grupal. Em outro tem uma cadeira erótica, na qual dá para fazer diversas posições. Ela aparece também em outro quarto de swing.
Há um quarto de voyeurismo, com vidros nas laterais. As pessoas de fora veem as de dentro e vice-versa. Tem uma cela, com luz amarela, para fetiche de transar com gente presa. E um quarto bem parecido com motel, com banheira de hidromassagem.
As salas de sadomasoquismo e glory hole estão em reforma, mas serão abertas em breve. Um dos quartos é bem amplo e tem uma área externa. Costuma ser alugado para festas privativas, no valor de R$ 700 a R$ 1 mil a diária.
Apesar de toda estimulação e infraestrutura, quem quiser frequentar a casa e não fazer sexo pode. Aliás, muitos entram da primeira vez e apenas observam. Depois, vão evoluindo no decorrer de outras visitas, quando percebem que ali tudo é permitido, com respeito, e nada é fora da lei. “Fazer sexo não é ilegal. Prostituição que é, mas aqui dentro não permito”, afirma o empresário.
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Sigilo absoluto
O casal J.J. afirma que o sigilo é prioridade absoluta no local de realização de fetiches e fantasias, até porque é frequentado por muita gente de renome, autoridades públicas, servidores.
Em época de pandemia, a casa tem trabalhado com reserva. Enquanto dava entrevista, o empresário recebeu duas ligações de clientes. Segundo ele, em dias mais agitados já chegou a fazer festa para 450 pessoas. Durante a semana, as noites são mais calmas.
A night fica mais “quente” após as 22h, quando os casais vão chegando para uma experiência sensorial, que, em muitos casos, vicia.
Poucos querem se expor. “Swing é confiança, tem que passar as informações corretas na entrada, eu converso com os homens e minha esposa com as mulheres. Não pode usar celular, não pode câmera. Nunca vazou nada daqui. Semana passada mesmo tinham duas autoridades na casa”, comenta.
Na vida pessoal, o próprio empresário restringe informações sobre o que faz. Tem pais mais velhos e filhos pequenos que não sabem dos detalhes. Ele procurou psicóloga para aconselhamento e, por enquanto, a orientação passada é de que é melhor esperar que as crianças cresçam mais para serem informados sobre o ramo de negócios que a família toca.
Apesar da vergonha, medo ou outro tipo de receio, pelas contas do empresário 7 a cada 10 pessoas têm curiosidade de conhecer uma boate assim, mas não vão por medo. “Não precisa ter medo, venha, conheça, ninguém vai te perturbar, é uma balada como outra qualquer”, assegura.
Casal liberal
Se o sigilo é importante para muitos, para alguns poucos não é. Se consideram maduros, pagam as próprias contas, sentem-se profissionais competentes, pais afetuosos e donos do próprio nariz. É o caso do casal liberal de Cuiabá, Thiago, de 38 anos, e Pri Bonna, 31.
Ele é fortão, lutador de jiu jitsu. Já ganhou dois cinturões em campeonatos e é professor da arte marcial. Embora conviva com muita gente conservadora no esporte, afirma que a filosofia do jiu jitsu é acolhedora, seja para LGBTs, deficientes físicos, pessoas acima do peso e discriminação não é bem-vinda. Pri é uma mulher sexy, estudante de Nutrição e blogueira. A ideia de fazer swing há 4 anos partiu dela. Eles estão casados há 6 anos e afirmam que se amam e se permitem, juntos, essas ousadias, o que só reforçou o vínculo, a amizade entre eles e o prazer também.
Confessam que na primeira vez gerou constrangimento no outro dia, na hora de acordar e se olharem na vida cotidiana de uma família como outra qualquer, com dois filhos para cuidar e tarefas domésticas a fazer. Mas, aos poucos, foram pegando confiança e naturalizando as experiências. Melhor isso, na opinião dos dois, do que as traições, mentiras ou abafar desejos.
Aos filhos, esperam ensinar o respeito ao próximo, às diferenças e que sejam bons profissionais. O que cada pessoa faz sexualmente é da intimidade dela e isso não define caráter de ninguém.
Thiago se diz budista (pelo menos se interessa pela filosofia) e Pri, católica. Ele é hetero e ela também, mas faz bi feminino. Experimentaram várias práticas e contam com naturalidade como vivenciam o erotismo.
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Solteira
Nina tem 36 anos e ela prefere não revelar a identidade. Máscara preta, usada para tapar o rosto, contrasta com o ruivo do cabelo comprido. Mulher jovem e bonita, lá fora afirma que é escritora e blogueira de temas eróticos e tem livros publicados em plataforma digital. Faz também “acompanhamento”.
Dentro da Fire Club, no entanto, afirma que não tem nada disso. “Venho para lazer, já experimentei muita coisa, sou curiosa”, diz ela, que é muito procurada para ménage.
Considera-se hétero, mas faz bi, sem problemas. Não conta para família sobre suas preferências sexuais, mas para amigas sim, tanto é que comemorou o último aniversário na Fire Club.
Não bebe, não usa drogas, é o que afirma. “Gosto de ficar atenta a tudo”, justifica. Nunca se viu em situação desconfortável ou violenta na casa, e as abordagens, segundo diz, são muito naturais. “Em barzinho, já agarraram meu pescoço e me beijaram à força. Isso aqui não acontece”, afirma. Outra coisa que gosta na boate é de se vestir de forma bastante sexy, sem ser julgada.
Na primeira noite que entrou, antes de pular na piscina, tirou toda a roupa espontaneamente. Depois ficou pensando: meu Deus, estou completamente nua. Logo em seguida começou a se sentir muito à vontade e nunca mais parou de frequentar.
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Produtos eróticos
Caso clientes não se sustentem com o que tem na casa, o casal J.J. providencia outros produtos eróticos, como por exemplo máscaras, calcinhas e apetrechos de sexy shop. São tantos parceiros neste ramo, segundo diz, que em 10 minutos chega o que for solicitado, caso já não tenha em estoque. Pedidos especiais podem ser feitos também na reserva.
Limpeza
O casal J.J. faz questão de ressaltar que a higiene da casa é feita regularmente e a água da banheira de hidromassagem tratada e trocada com frequência. Todos os ambientes têm papel e álcool em gel. Afirmam também que a limpeza está mais criteriosa devido à pandemia.